"MARIANA nos convida para uma interessante jornada, emprestando-nos “seu olhar” para mostrar,
através da narrativa de seus pensamentos, sentimentos e emoções, tudo que existe além das “DIS-HABILIDADES”.
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segunda-feira, 25 de março de 2013

Ica e a Mágica


A tempestade rugia feroz na noite escura.
A chuva desabava como um grande dilúvio, em meio a relâmpagos e trovoadas.
Por todo lado só havia escuridão.
ICA tentou ligar a luz do abajur e não havia energia.
Todos dormiam, menos ICA, que de olhos arregalados, observava os pingos da chuva batendo na vidraça da janela, como se quisessem entrar, empurrados pelo forte vento que uivava lá fora fazendo a cortina esvoaçar.
Cada relâmpago trazia para dentro do quarto, figuras terríveis: mãos gigantes subindo pelas paredes, sombras de asas enormes e escuras, ora num canto ora noutro, olhos apavorantes que apareciam aqui e ali brilhando no escuro e se misturando à luz dos raios.
ICA tremia.

Em um dos clarões, ICA viu seu ursinho cair da cadeira onde o deixara e sumir na escuridão do tapete.
O quarto estava um caos, ICA sufocava de medo.
Junto com o barulho da chuva e do vento Ica começou a escutar um som forte e ritmado (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM) que parecia vir de todos os lados (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM)

ICA fechou os olhos, tapou os ouvidos, mas o som continuou mais alto e mais forte (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM) fazendo Ica tremer ainda mais.
ICA tentou gritar, mas o grito ficou preso na garganta, e depois, com todo o barulho da tempestade e aquele (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM) aterrador, ninguém ouviria mesmo.
ICA puxou o cobertor sobre à cabeça e o barulho imenso pareceu mais forte (PAM PAM, PAM PAM,PAM PAM)
ICA começou a chorar.
Nisso ela ouviu, vindo de muito longe, a voz de sua avó: - Calma ICA...


A avó de ICA, já havia ido para o céu há um tempo, que para ICA parecia muito tempo. ICA sentia muita saudade dela e lembrava sempre das coisas que em vida ela lhe dizia; e agora ela ouvia como se a avó lhe falasse através da tempestade:
_ICA, Você é uma bruxinha!
_Como todas as meninas você tem poderes!
_Não esqueça nunca, quem tem poderes tem responsabilidades!
_ Procure sempre o lado bom em todas as coisas!
_Tenha sempre amor e respeito por você e por todos os seres da natureza

A voz da avó parecia sair de dentro do (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM) que tanto a assustava:
_ICA, não tenha medo! É apenas uma tempestade, está lá fora e já vai passar. As coisas que tanto a assustam, os monstros, as sombras, são apenas sua imaginação, são ilusões criadas pelo medo.

ICA afastou o cobertor da cabeça e olhou para o quarto. As sombras, as asas, os olhos estavam por todos os lados; a chuva na janela, as cortinas esvoaçando, tudo continuava lá, fazendo ICA tremer de medo.
A voz da avó sussurrava através do (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM) que parecia ainda vir de todos os lugares:
_ICA, lembre-se da magia que ensinei pra você usar quando tivesse medo!

ICA lembrou da grande mágica, como poderia ter esquecido, usava sempre quando estava triste ou se achava em perigo. ICA respirou fundo e se preparando para o ritual, cruzou as mãos sobre o peito, fechou os olhos e rezou: _Ave Maria, cheia de graça...
Enquanto rezava, ia esquecendo a tempestade lá fora e o terror dentro do quarto.
_Bendita sois vós entre as mulheres...

O (PAM PAM, PAM PAM, PAM PAM) , foi diminuindo...diminuindo... diminuindo... e ficou bem suave do lado esquerdo do peito de ICA; seus olhos foram fechando... fechando... e sentindo o perfume de sua avó, sentiu o doce calor do beijo dela em sua testa antes de adormecer ao som de seu coraçãozinho (pam pam, pam pam, pam pam).

Escrito por Ana Nunes (Ica)

segunda-feira, 18 de março de 2013

Meninas Arco-Íris


Caía uma chuva tão gostosa lá fora que Luísa desejou poder sair correndo da aula antes do sinal. Queria sentir os pingos no rosto, pisar nas poças pra escutar o barulho d’água, se refrescar daquele calor horroroso que não a deixava juntar dois mais dois sem perder a conta.  
           
Cutucava Júlia com a ponta do lápis, impaciente, tentando se livrar um pouco da agitação. Será que só ela se sentia assim? Sempre mais interessada no “lá fora” do que na aula? Júlia se remexia, sinalizando que ficasse quieta, mas Luísa sabia que a amiga gostava que a provocasse.
           
Quando, enfim, o sinal tocou e Luísa pisou na calçada, restara uma fina garoa e a rua molhada. E poças! Puxou Júlia pela mão, apressando-a, e espalhando água por onde passava. Queria chegar logo em casa, estava ansiosa pelo copo de leite com bolo de chocolate que a mãe lhe prometera.
           
Enquanto tentava convencer a amiga a lanchar com ela, percebeu-a estancar. Voltou os olhos pra onde Júlia olhava, e estancou também. Num ponto do horizonte se abria uma clareira de um azul esverdeado que parecia pintado, tão vivo estava. A mancha de cor foi crescendo, crescendo, e, de repente, se podia perceber uma faixa avermelhada no horizonte ficando mais e mais forte, e, antes que as duas pudessem piscar, já se formava um céu listrado. Vermelho, azul, verde, amarelo... o arco-íris parecia sorrir  pra elas, cada vez maior.
           
Luísa pensava no bolo, e no leite, e na mãe que lhe esperava... mas não conseguia sair dali, encantada. Era tão raro um arco-íris exibido, se mostrando assim, sem fugir rápido... Pensou no pote de ouro que diziam haver ali na ponta, e nas mentiras que os adultos viviam inventando...

  
Então o arco-íris já tinha outras cores, estava se espalhando e se misturando todo. Cada vez mais transparente, e agora já rosa e amarelo e azul claro... Luísa apertou a mão de Júlia, como se pudesse com isso segurar o arco-íris ali, quietinho. Júlia achou graça do jeito da amiga. Percebeu um pesar em seu rosto, uma tristeza por saber que assim que piscassem mais demoradamente o céu voltaria a ser o de antes, só azul e nuvens passeando. 
           
Quando, finalmente, tudo voltou ao normal, as duas seguiram, lentas, quietas, pensativas. A garoa cessara.
           
Luísa pensava que Júlia era colorida como o arco-íris. Sempre enfeitada, sempre feliz e iluminada.
           
Júlia pensava que Luísa era fugaz como o arco-íris. Sempre alegre e em movimento, vinha de repente, iluminando tudo, e de repente se ia, em busca sabe-se lá do quê...
           
As duas se olharam, sorrindo, como se uma adivinhasse os pensamentos da outra. Júlia resolveu aceitar o convite da amiga. Abraçaram-se, contentes, e saíram correndo em direção ao bolo de chocolate.
           
Enquanto olhava as meninas se lambuzando, felizes e barulhentas, a mãe de Luísa pensava em como a farra delas coloria sua vida. Luísa e Júlia eram como um lindo arco-íris num gostoso dia de garoa e sol...

Escrito por Ana Lúcia Sorrentino
em 17/11/2012

segunda-feira, 11 de março de 2013

Contando, cantando, criando...

Anos sessenta.
Tempo de Festival da Canção na televisão. 

Eu adorava cantar. Sabia de cor algumas músicas do festival. 

Meu avô achava aquilo uma graça. 
Vovô ligava todo dia para mim, depois do almoço. 
Nossa conversa era sempre assim: ele perguntava o que eu tinha comido no almoço e se estava gostoso, como tinha sido meu dia na escola e pedia para eu cantar para ele. 
Eu sempre cantava para ele:


"Estava à toa na vida,
o meu amor me chamou,
pra ver a banda passar,
cantando coisas de amor."

Aí vinha a parte mais importante:

"O 
velho fraco que contava dinheiro parou"

Eu dizia que era meu avô paterno, que só falava do preço das coisas e era um homem muito alto, de óculos e sempre muito ansioso. Já

"O faroleiro que contava as estrelas parou"
Eu dizia que era meu avô materno, que contava sempre histórias que vinham de livros e outras que ele inventava transformando parentes em personagens. Vovô faroleiro me dava um dinheirinho de tempos em tempos. 

Naquela época eu não sabia distinguir semana de mês.
Ele dava o dinheiro e dizia que era para eu comprar um sorvete.
Mas o dinheiro era tanto que dava para comprar outras coisas.

Eu adorava uma bonequinha pequena chamada Vivinha que tinha na seção de brinquedos da Sears Água Branca. 

E eu guardava meus cobres para comprar a Vivinha. 
Tive uma Vivinha loira e uma ruiva. 
As duas eram bonequinhas flexíveis.
Eram amigas e faziam companhia uma para outra.

E quando eu tinha vontade de tomar sorvete, que era sempre que estava quente, meu avô me levava para tomar sorvete. 
Era um segredo entre a gente, porque lá em casa, como eu tinha muita dor de garganta, meus pais não deixavam tomar sorvete. 
O sorvete de morango que meu avô me dava nunca me provocava dor de garganta. 

Então, logo cedo, descobri que o melhor era tomar sorvete com vovô e só comer bolo em casa. 
E assim caminhava a infância. 

Escrito por Ana Lúcia Brandão (Tucha)

segunda-feira, 4 de março de 2013

UNI, DUNI, TÊ, SALAMÊ, MINGUÊ

A menina estava sempre envolvida com as três bonecas, o cachorro e a cantoria.
De manhã bem cedo já cantarolava, brincando.
O pai, ao sair para o trabalho, deu a ela uma função:
Deveria catar as pulgas do cachorro.
Mas as pulgas pulam! Disse a menina.
Então o pai entregou-lhe um vidro com uma tampa e dizendo que ali as pulgas poderiam pular à vontade.
Ele pagaria alguns centavos de cruzeiro por cada pulga "envidrada", no final do dia.

Não seria difícil, pois o cachorro tinha um tom leitoso e adorava cafunés.
A menina passava os dedinhos entre os caminhos do cão e, de vez em quando, via uma pulga minúscula.
Começava então a aventura de ser mais rápida que elas.
Dedinhos, caminhos e pulgas! Cuidado minucioso ao pinçar a pulga entre o pequeno polegar e o indicador.
Pronto! Uma estava já garantida. Outra e mais outra.


Assim, durante muitas tardes a cantoria embalava o cão, deitado ao lado das três bonecas e a menina conseguia pelo menos umas sete pulgas para colocar no vidro.
Ela gostava de ter algumas moedas assim, como merecimento. Era até divertido.
Enquanto catava e cantava ela podia imaginar que as pulgas eram moedinhas de ouro que ela encontrava no caminho, na estradinha da floresta do cachorro.
Aquelas moedinhas um dia virariam letras e saberiam encontrar seus caminhos.

Moedinhas de ouro...
Ouro em memórias.
Ouro que são histórias
De meninas, bonecas, cachorro
e abraço de pai.

Escrito por Rita Nasser

Uni, duni, tê
Salamê, minguê
Para brincar de contê
O escolhido foi você!


Conta uma também...